sexta-feira, abril 29, 2005

New Blog

Post colocado apenas para parabenizar o passo importante na vida do inamigo (mistura de inimigo com amigo) Martins na criação de seu blog que, diga-se de passagem, ainda está tosco! (Hehehehe...) Link ao lado.

terça-feira, abril 26, 2005

RAMONES – I Believe In Miracles

I used to be on an endless run
Believe in miracles ’cause I’m one
I have been blessed with the power to survive
After all these years I’m still alive

(...)

sábado, abril 23, 2005

Um drink!

Era noite. Naquele bar, depois de alguns minutos conversando, comecei a beber realmente. Entre notícias tristes, piadas e suposições. Voltei. Churrasco. Risadas, sempre as risadas. Uma banda tocando no fundo, muita dança e muita situação engraçada. Nada demais, apenas as mesmas coisas de sempre. No meio de tudo, vaias depois de uma viagem. Morto, morto. Só pensava em morrer. Placebo, muito bom. Enfim voltei a frequentar bares, com amigos e amigos de amigos. Hoje, para não perder o costume, algo mais forte. Dança, música alta e mais bebida. O inferno sempre está mais próximo que o céu.

terça-feira, abril 19, 2005

Oh Why Do You Call Me A Lunatic?

Apenas um post pessoal. Andando no sol quente nessa terça-feira e fritando meu cérebro na pasta imunda que chamo de mente. Ouvindo Carbona, lembrei do show que fui deles. Muito bom por sinal. Lembrei de outros shows que fui (Teenage Fanclub, Pixies, Bad Religion, No Fun At All, Down By Law, Offspring, etc). Depois pensei nos shows que quero ir. Um ainda essa semana: Placebo, em Florianópolis, daqui dois dias. Nunca fui no show do Placebo e nunca fui para Florianópolis, portanto eu sei que será uma experiência e tanto. De repente lembrei que se não fosse por um convite eu não iria. E isso me deixou muito arrependido. Também lembrei que existem outras coisas que gosto muito de fazer, como cinema, teatro, museus, etc. Mas, infelizmente, não é todo mundo que frequenta lugares desse tipo. Perder filmes apenas por "não ter com quem ir" já não faz parte de mim. Vi peças muito interessantes no festival de teatro. Toda semana um filme novo. E então olho para o meu passado, um passado mais distante, onde todas essas coisas não eram tão importantes para mim. Agora é diferente. Agora quero que minha vida fique mergulhada em uma atividade intelectual intensa. Shows, cinema, teatro, livros, etc... E ainda continuo ouvindo Carbona. Oh why do you call me a lunatic?

sexta-feira, abril 15, 2005

O coração partido e o orgulho ferido
Qual mistura poderia ser pior
Que o melhor dos vinhos?
Joguem agora suas taças cheias
Contra qualquer detalhe ínfimo
Mas elas caem e se partem
Contra os corações duros
Agora sujos de verdade

Cacos com marcas de batom
Palavras vazias no meio da noite
Eterna negação do forte desejo
E ainda continuam os mesmos
Aparentando ainda inocentes
Porém culpados e inconscientes

quinta-feira, abril 14, 2005

Capítulo Final

O que é mais estranho é essa lei, chamada vida. No começo eu até achei engraçado, mas depois eu chorava feito um condenado diante dos fatos que não conseguia compreender. Taxei todo mundo de louco. Mas o insano era eu, e essa descoberta veio muito tarde. Já estava com as mãos manchadas de sangue e óleo, e apesar de conseguir ver claramente todos os fatos finalmente compreendi que não era capaz de entender como eles estavam interligados.
Desci as escadas atrás dela, que chorava e gritava constantemente. O lapso de minha mente e minhas lembranças não me deixou raciocinar corretamente. A única coisa que tinha certeza era que eu não queria perdê-la. Não sabia mais seu nome, nem como ela tinha parado ali. Só sabia que já a tinha visto. Ela estava de costas para mim, deitada. Mas naquele momento ela corria por entre corredores e árvores, com lágrimas lavando seu rosto e gritando meu nome com ódio. E a única coisa que eu conseguia fazer era assistir a tudo, correndo atrás dela suplicando pelo perdão de pecados que eu não havia cometido. Se eu soubesse da verdade tudo seria mais fácil.
Ela parou e se virou. Sim, eu conhecia o rosto dela. Mônica, minha namorada. Não, não era a mesma pessoa de outra ocasião. Bem que eu gostaria, mas se fosse ela eu a teria reconhecido. Ela olhou para mim e disse palavras que eu não pude compreender, pois não reconhecia mais nada de racional em nenhum lugar. Nem mesmo na linguagem, nem mesmo na tentativa de comunicação. Bosques de cidades com árvores e paredes. Grama e asfalto se misturavam, e ao redor prédios inteiros diante de cachoeiras de água azul e fria. Meu próprio ambiente entrou no caos.
Então veio a luz. A luz que indicou o caminho. Não era necessário mais ter ordem, de nenhuma espécie. Por isso eu deitei no chão úmido pelas nuvens. A cabeça apoiada na grama, o braço direito caía sobre o asfalto. O braço esquerdo estava sobre rochas vulcânicas e as pernas em oceanos e lagos. E tudo isso fez sentido. Ao meu lado Mônica não chorava mais, não corria e não gritava. Estava em paz. Havia compreendido tudo. Então meu amigo (será que podia chamar de amigo?) abriu aquilo que parecia ser uma porta e viu ela ainda de costas para mim, deitada.

FIM

quarta-feira, abril 13, 2005

Capítulo 06

Naquela mesma noite eu fui embora com meu amigo (será que podia chamar de amigo?). Ele me deixou em casa, que fedia comida estragada. Eu não costumava seguir os costumes padrões de higiene, tanto física quanto mental. Por isso o meu apartamento era, literalmente, um lixo. Várias roupas sujas pelo chão, vários restos de comida por todo canto da casa. Os insetos faziam festa, e os vizinhos sempre reclamavam. Mas eu sabia que eram mais porcos que eu, com suas roupas lavadas com sabão em pó de comercial da televisão, dirigindo carros limpos e conservados enquanto levam os filhos, todos excelentes estudantes, para o colégio particular próximo do prédio. Suas vidas, quando eu olhava pela janela, parecia ser o oposto daquilo que eu queria para mim.
Passei a noite suavemente. Adormeci na minha cama, sem compreender nada do que havia acontecido. No dia seguinte eu acordei com o interfone tocando. Eu atendi com aquela cara de zumbi, e o porteiro, que sempre está com um palito entre os dentes, apenas me informa que a Mônica, minha namorada, estava subindo. Agradeci a informação, mas eu realmente fiquei desesperado. Eu havia sumido durante dois dias, provavelmente ela havia me procurado e agora estava desesperada por informações. Poderia até mesmo estar brava, cogitando milhões de fantasias que somente aquela cabecinha poderia criar. Ela era demais para mim. Enquanto eu pensava tudo isso eu comecei a fazer o café. Afinal de contas, depois de todo o estresse, eu deveria estar com uma cara de ressaca incriminadora. Estava pronto para enfrentar problemas com a Mônica, minha namorada, provavelmente mais uma discussão sobre nossa relação.
A campainha tocou e eu fui abrir a porta. Mônica, minha namorada, estava linda como sempre. Ela tem a pele clara, cabelos escuros e lisos que passam suavemente pelos seus ombros, olhos castanhos muito brilhantes (pelo menos quando eu a olhava nos olhos) e um rosto angelical. Seu corpo satisfazia facilmente minhas necessidades tipicamente masculinas. Também era uma garota esperta, radiante, sem em nenhum momento ser desagradável. Olhei para ela e logo lembrei de como a tinha conhecido.
Mônica estudava artes plásticas em uma universidade conceituada. Eu sempre a via passando pelos corredores, e sempre desejei conhecê-la melhor. Um dia eu andava calmamente pela rua quando eu a vi vindo em direção oposta. Não sou o tipo de cara que interrompe uma garota em plena rua, durante o dia, quando uso calça azul, mas fiquei com muita vontade de perguntar pelo menos seu nome. Senti um frio na barriga enquanto ela se aproximava, pois o momento estava chegando, e eu sentia uma obrigação de fazer alguma coisa para não deixar aquele momento passar. Ela olhou para mim, provavelmente me reconhecendo ou pensando em de que lugar ela havia me visto. Depois eu fiquei sabendo que ela já tinha me notado também, o que facilitou muito o avanço de nossa amizade para o namoro. Mas, quando eu estava quase ombro a ombro com ela, uma pedra malvada se intrometeu entre a calçada e o pé dela. O resultado foi um tombo fenomenal. Eu olhei aquele corpinho caindo praticamente na minha frente, e fiz uma coisa que todos os cavalheiros fariam: ri muito! Dei algumas gargalhadas, o que a fez ficar um pouco desconcertada. Mas foi apenas num primeiro momento. Logo depois ela se levantou sozinha e olhou para mim enquanto eu ria. Ela sorriu também, e fez um comentário sobre a minha falta de educação de rir de tal situação. Eu não conseguia responder direito, mas no meio das risadas eu apenas pedi desculpas. Ela sorriu e falou que seria muito melhor se eu a ajudasse, pois é assim que os homens deveriam tratar as mulheres. Olhei para ela, com minha risada chegando ao fim. Suspirei fundo e disse que não, que os homens que ajudam as mulheres apenas por educação são mais machistas do que eu gostaria de parecer. Ela me questionou os motivos disso, e eu expliquei que a gente não deve ajudar quem não precisa. Continuei falando que isso é um sinal de superioridade, como se a mulher não tivesse capacidade de puxar uma cadeira para se sentar ou de abrir alguma porta. Ela falou que havia se machucado. E eu acrescentei que ela se levantou perfeitamente sozinha, o que é muito mais digno para quem cai daquele jeito no meio da rua. Ela ficou séria. Depois conversamos um pouco, e mais ainda quando nos encontramos pela segunda fez. Passaram algumas semanas e já estávamos saindo juntos. Numa noite ficamos bêbados (amém ao álcool) e nos beijamos. Ela se tornou Mônica, minha namorada.
Ela estava parada na frente da porta me olhando. Então eu sorri e ela passou por mim entrando no meu apartamento. Ela não disse nenhuma palavra. Olhou em volta, a sujeira que era minha casa, e falou:
- Quando você vai limpar esse troço?
Dei de ombros. Eu sabia que tinha que fazer alguma coisa para agradar a Mônica, minha namorada, mas eu não levantaria nenhuma palha para arrumar meu apartamento. Afinal de contas ele é meu. Bom, nem tanto, mas quase. Ela olhou para mim com aquela cara de piedade misturada com indignação e perguntou aquilo que eu sabia que perguntaria:
- Onde você foi?
- Quando? – Perguntei como se não soubesse.
- Ontem... Anteontem também! Vim aqui e não tinha ninguém. Hoje já estava decidida a ir ao IML caso não te achasse aqui. O que aconteceu? – E ela me olhava com aquela cara de preocupada, mas pronta para virar uma cara de raiva dependendo da minha resposta.
- Foi estranho, até hoje não entendi...
- Conte tudo!
- Resumidamente eu quase apanhei até morrer, por isso fugi. Depois eu voltei, ainda com medo, mas fui aclamado por nenhum motivo. Tive conversas bizarras com pessoas estranhas e acabei a noite com dor de cabeça – mentira – deitado na minha cama.
- Que bom...
- Bom?!
- ... que você falou a verdade.
- Como assim? Você sabia?
- Eu estava lá.
- Lá onde?
- Bem ao seu lado. O lado que você não olhou.
Sentei no sofá, coloquei a mão na cabeça. Ela sorria para mim e sentou do meu lado, me abraçando e passando sua mão carinhosamente em meu ombro. Ela cheirava muito bem, eu realmente gostava dela. Mas eu só tinha uma pergunta: como assim? E então percebi que o mundo tinha entrado em um estranho colapso, mas só eu não havia me adaptado. Olhei para ela, levantando, e exclamei:
- Agora é hora de contar a verdade!
- Sobre o quê?
- Sobre tudo isso que está acontecendo comigo! Que aconteceu! Como você faz parte disso e não me conta?
- Eu te amo!
Essa declaração fez muito sentido.

terça-feira, abril 12, 2005

Capítulo 05

A vida não podia ser mais engraçada. Realmente fiquei pensando na confusão que havia me metido. Em apenas dois dias eu já tinha uma carga de estresse muito maior que qualquer piloto de avião kamikaze se dirigindo para o alvo. Está bem, nem tanto. Mas eu não entendia nada. Então eu percebi que estava bancando o bobo no meio daqueles acontecimentos insanos, sendo totalmente apático, sem ação nenhuma! Meu amigo (será que podia chamar de amigo?) empurrou meu corpo contra aquilo que parecia ser uma porta. Ele olhou para os meus olhos, e eu pude perceber apenas um tímido brilho neles. Não conseguia ver direito, mas eu podia dizer que ele sorria para mim, muito agradecido. Então eu fiquei um pouco aliviado, pois eu achei que ia ser muito mais difícil, mas eu fui apenas eu mesmo e ela, a moça que estava de costas para mim, deitada, não fez nada. Então eu arrisquei uma pergunta para tentar compreender toda essa situação:
- O que aconteceu?
Meu amigo (será que podia chamar de amigo?) olhou para mim e não disse nada nos primeiros instantes. Fiquei preocupado. Ele estava muito emocionado, o que por um lado poderia ser ruim. Então eu o afastei com meus braços e exclamei:
- Quero que você me explique tudo o que está acontecendo!
- Calma – meu amigo (será que podia chamar de amigo?) disse.
- Estou calmo, mas exijo explicações! Afinal de contas, uma multidão furiosa me perseguia e você me salvou dela, me levou para bem longe, depois voltamos e entramos nos fundos desse bar onde tive um papo estranho com uma garota lunática. Quero saber qual é a ligação entre todas essas coisas e entender os motivos de ser odiado e amado ao mesmo tempo!
- Você tem todo esse direito, eu sei. Mas vamos sair daqui, vamos para um lugar melhor.
- Não, não vou a nenhum lugar enquanto você não me explicar tudo!
- Eu não faria isso se fosse você.
- Está me ameaçando?
- Não. Estou te avisando – meu amigo (será que podia chamar de amigo?) disse isso calmamente.
- Vou ficar aqui! E você vai me explicar tudo!
- Eu não vou ficar. Você faz o que quiser.
- Então vá, eu fico aqui. Talvez sozinho eu consiga achar uma resposta para minhas dúvidas!
- Duvido muito, mas a opção é sua.
Meu amigo (será que podia chamar de amigo?) virou as costas e saiu. Vi sua sombra desaparecer no meio da escuridão, indo para a parte da frente daquele bar. Fiquei sozinho, pensando, encostado naquilo que parecia ser uma porta. Depois de nossa conversa medíocre, o silêncio imperou no corredor. De dentro do quarto da garota sinistra, que parecia uma mistura de oráculo de filmes antigos com uma hippie dos tempos mais antigos ainda, não saía nenhum som. Fiquei intrigado. Não queria ficar ali, mas também não suportava a idéia de voltar atrás e continuar com essa história até o ponto ótimo da total falta de compreensão. Então eu resolvi colocar um fim naquilo tudo.
Respirei profundamente e me virei. Fiquei de frente para aquilo que parecia ser uma porta. Então, como meu amigo (será que podia chamar de amigo?) fez, eu comecei a abrir. Não estava trancada, acho sequer que não tinha fechadura, mas de qualquer forma ela se abriu facilmente. Reencontrei a garota que estava de costas para mim, deitada. Ela não falou nada, parecia que estava meditando ou dormindo, mas eu não me importe. Logo já disse:
- Você!
Ela se mexeu lentamente e respondeu:
- Eu? – Ela ainda estava de costas para mim, deitada.
- Não fique mais de costas para mim! Deitada ai! Levante-se ou eu vou até ai!
- Não... Não vou me levantar e você não pode vir até aqui! São as regras do jogo – Ela ainda estava de costas para mim, deitada.
- Então veremos!
Disse isso dando um passo largo pelo quarto, chegando perto das almofadas. Então eu dei outro passo, menos largo, e me aproximei mais ainda dela, que ainda estava de costas para mim, deitada. Por algum motivo minha perna travou. Eu não consegui me mexer, mas não fazia força para tanto. Então eu dei um passo para trás, e verifiquei que meu pé não estava grudado no chão. Tentei novamente avançar, mas a vontade terminava assim que eu tentava. Eu gostaria muito de ver o rosto dela, de saber como ela era e desvendar tudo isso, mas ao mesmo tempo manter esse mistério era agradável.
- Agora você pode pensar! – Disse ela, que ainda estava de costas para mim, deitada.
- Como assim?
- Você pode ficar no limite, mas nunca vai avançar enquanto ainda tenta compreender as coisas... – Ela ainda estava de costas para mim, deitada.
- Seja clara, por favor!
- Eu não posso. Estou do outro lado. Do seu lado, mas aquele que você não vê. Aquele que você nega! Então eu não posso te explicar nada. Sinto muito – Disse ela, que ainda estava de costas para mim, deitada.
Nada fazia sentido! Essas declarações não tinham nenhuma base! Pelo menos naquela hora... Como ela poderia estar do meu lado nessa guerra, mas ao mesmo tempo dificultar as coisas? Muitas dúvidas, muitas perguntas! Eu não conseguia passar de um determinado ponto daquele quarto, não conseguia avançar. Mas para trás eu sempre podia ir. E eu não havia nada me impedindo fisicamente, portanto o problema era apenas comigo. Comecei a cogitar, bem no fundo, lá no meu interior mais imundo possível, escondido entre os ratos que fazem minha consciência pesar, entre o lodo e o mofo de meus pensamentos mais obscenos, a possibilidade de que, talvez, sem nenhuma certeza, pudesse existir alguma força oculta que, por acaso, estaria me impedindo de avançar. Mas isso era apenas especulação vazia de sentido. Fiquei intrigado e saí, por aquilo que parecia ser uma porta, atrás de meu amigo (será que podia chamar de amigo?), andando angustiado pela escuridão do corredor.

quinta-feira, abril 07, 2005

Capítulo 04
Eu realmente não conseguia ver mais nenhum palmo na frente do meu nariz. Era possível se guiar apenas pelos sons dos passos de meu amigo (será que podia chamar de amigo?) caminhando na minha frente. Atrás de mim ficaram as pessoas do bar, em silêncio contemplativo.
Depois de alguns passos meu amigo (será que podia chamar de amigo?) parou. Ouvi seus passos diminuírem o ritmo, e eu o acompanhei. Paramos na frente do que parecia ser uma porta. Depois de alguns segundos sem dizer nada, ou fazer qualquer movimento, meu amigo (será que podia chamar de amigo?) disse:
- É agora. Ela está lá dentro. Esperando...
- Esperando? Eu?
- Você não! Ela!
- Eu esperando ela?
- Não, imbecil! Ela está te esperando!
- Sim, sim... Claro!
Fiquei parado na frente daquilo que parecia ser uma porta. Então meu amigo (será que podia chamar de amigo?) se afastou, dando alguns passos para trás, deixando a passagem livre para mim. Eu avancei alguns passos, ergui minha mão e comecei a empurrar aquilo que parecia ser uma porta. E aquilo que parecia ser uma porta se abriu.
Uma luz fria e tímida saía de lá de dentro. Era um pequeno quarto com cheiro bom. Várias almofadas coloridas estavam jogadas pelo chão, que parecia ser extremamente limpo. As paredes eram de tom azul, mas podia dizer que também eram verdes. Uma garota estava sentada nas almofadas de costas para a entrada. Dei alguns passos e entrei no quarto. Meu amigo (será que podia chamar de amigo?) permaneceu do lado de fora e fechou gentilmente aquilo que parecia ser uma porta atrás de mim. Foi quando a garota disse sem se virar:
- Quem é?
- Eu!
- Eu quem? – Ela ainda estava de costas para mim, deitada.
- Meu amigo – (Será que podia chamar de amigo?) – disse que você estava me esperando. Bem, estou aqui!
- Ah! Eu lembro de você... – Ela ainda estava de costas para mim, deitada.
- Lembra? De onde? Quando?
- Uma pergunta de cada vez, por favor – Ela ainda estava de costas para mim, deitada.
- Você lembra de mim da onde?
- Uma lembrança remota, de uma outra vida – Ela ainda estava de costas para mim, deitada.
- Como uma vida anterior? Na qual a gente teve alguma espécie de relação, e agora que estamos reencarnados em outros corpos você percebe que a gente já se conheceu?
- Não, não existe reencarnação – Ela ainda estava de costas para mim, deitada – Eu te conheci em outra vida, mas mudar de vida não significa que você deve necessariamente morrer.
- Entendi, como quando a gente muda alguma característica importante de nós mesmos?
- Também não – Ela ainda estava de costas para mim, deitada – Mas isso pode servir de exemplo para uma mudança. Uma boa mudança para você seria deixar de lado clichês de auto-ajuda.
Depois dessa patada fenomenal, permaneci em silêncio. Ela ainda estava de costas para mim, deitada. Eu podia perceber o movimento que ela fazia para respirar, suavemente. Seus cabelos escuros, lisos e longos estavam jogados nas almofadas coloridas nas quais ela se apoiava. Seus braços eram finos, o que indicava que ela não era gorda. Então eu pensei que talvez eu a conhecesse de outra ocasião, alguma amiga distante. Mas eu não a reconheci, pois ela estava de costas quando eu entrei. Então eu disse:
- Mostre seu rosto.
- Por quê? – Ela ainda estava de costas para mim, deitada.
- Para eu ver se te conheço.
- Quem disse que você me conhece? – Ela ainda estava de costas para mim, deitada.
- Se você lembra de mim, talvez eu também lembre de você. Mas como eu não lembro de você, gostaria de olhar seu rosto. De repente eu lembre alguma coisa...
- Eu lembro de você porque te conheci – Ela ainda estava de costas para mim, deitada – Mas isso não quer dizer que você me conheça.
- Você pode estar certa, mas também pode estar errada. Talvez você não sabia que eu te conheça e ache o contrário.
Ela permaneceu em silêncio. A impressão que tive é que ela estava meditando, que ela tinha os olhos fechados, mas eu não podia ver para ter certeza. Fiquei em pé todo esse tempo, apenas esperando. Quando quero eu posso ser bem paciente. E foi o que eu quis fazer naquela hora. Permaneci parado sem falar ou fazer nada. Então ela disse, ainda de costas para mim, deitada:
- Confusão, não é? Primeiro querem te matar e você foge, agora te aplaudem sem motivos. Imagino o que você está pensando.
- Eu não estou pensando em nada.
- Exatamente – Ela ainda estava de costas para mim, deitada.
- O que isso quer dizer?
- Que já é o suficiente – Ela ainda estava de costas para mim, deitada – Pode se retirar, por favor.
- Como assim? Só isso?
- Sim, pode ir – Ela ainda estava de costas para mim, deitada.
- E eu não vou ver seu rosto? Você não vai me ver também?
- Pode ir – Ela ainda estava de costas para mim, deitada.
Então eu dei alguns passos para trás. Abri aquilo que parecia ser uma porta e atravessei. Ela não se moveu nenhum instante. E aquilo que parecia ser uma porta se fechou. Meu amigo (Será que podia chamar de amigo?) estava me esperando. Assim que parei na sua frente, sem dizer nada, ele me abraçou. Senti que chorava, por isso eu o abracei também. Então ele disse:
- Obrigado!

segunda-feira, abril 04, 2005

Capítulo 03
Voltei para o carro com a cabeça baixa. Eu não compreendia muitas coisas, mas tinha certeza que não gostaria de morrer. Não sei, eu não faço muito bem o papel de suicida tristinho. Eu prefiro muito mais correr da minha má sorte a entregar minha vida, nunca desistindo completamente de tentar mais uma vez. Mas eu também não gostava de ser obrigado a fazer isso.
Ele não disse mais nenhuma palavra. Entrou no carro e partiu de volta para a cidade. Não era mais necessário fugir, por isso a velocidade foi controlada. Demoramos mais tempo para voltar que para vir. Mas eu não estava preocupado.
Foram algumas horas para chegar. Era noite novamente, e por isso paramos em um bar no centro da cidade para comer alguma coisa, pelo menos essa era a desculpa do meu amigo (será que podia chamar de amigo?). Não havia movimentos nas ruas, mas mesmo assim eu procurava não me expor muito, com medo que uma nova rebelião começasse. Então meu amigo (será que eu podia chamar de amigo?) parou na porta do bar e me disse:
- A noite está bela.
Realmente estava. Mas eu não compreendia os motivos desse comentário desnecessário. Queria ele puxar conversa? Queria ele, finalmente, saber quem eu realmente sou através de um papo amigável? Mas ele prosseguiu:
- Existe uma diferença entre a beleza do dia e a beleza da noite. A noite é sempre mais suave quando é bela, não chega a ser um choque, mas impressiona. O dia bonito impressiona, mas machuca nossos olhos. Acho que é por causa da claridade.
- O quê isso tem a ver? – Não pude resistir a fazer essa pergunta.
- Entre no bar e você vai ver!
- O que tem lá dentro?
- Entre!
Suspirei fundo. Esse papo pseudo-filosófico não me impressionava mais. Aliás, aquela pose de messias urbano estava começando a me dar nos nervos. Minha vontade foi de dar um soco na cara dele, mas me contive. Entrei no bar sem olhar para trás.
A cena com a qual me deparei não teve grandes impressões. Algumas pessoas estavam de pé, com suas long necks. Outras estavam sentadas em pequenas mesas, conversando e rindo. Outras encostadas no balcão do bar, tomando seus drinks, fumando e rindo umas para as outras. Algumas pessoas olharam para mim, mas apenas com aquela curiosidade que o movimento nos trás, e logo depois voltaram para suas vidas como se eu não estivesse lá. Uma música barulhenta, mas não tão alta, saía de algumas caixas de som estrategicamente colocadas.
Meu amigo (será que eu podia chamar de amigo?) entrou logo depois de mim. As mesmas pessoas olharam novamente, mas agora suas expressões mudaram. Estavam assustadas e pararam de conversar. Meu amigo (será que eu podia chamar de amigo?) olhou para os lados, como se buscasse alguma coisa. A música não parou, mas ninguém conversava mais. Apenas observavam. Pensei que meu amigo (será que eu podia chamar de amigo?) tinha uma grande reputação naquele lugar. Então um cara atrás do balcão gritou para meu amigo (será que eu podia chamar de amigo?):
- Ela não veio hoje!
Meu amigo (será que eu podia chamar de amigo?) riu. Riu alto, e deu alguns passos para frente. Ninguém fez nenhum movimento. Então ele apontou para mim e disse:
- Não quero vê-la. Ele é quem vai no meu lugar...
Fiquei assustado. O que isso queria dizer? Então o mesmo cara de trás do balcão gritou:
- Então é por isso que ontem queriam matá-lo?
- É – Respondeu meu amigo (será que eu podia chamar de amigo?).
- Mas eu não quero ver ninguém! – Exclamei.
- Ninguém quer – Disse uma voz que não pude perceber de onde vinha.
- Não se preocupe, se tudo der certo você vai sair vivo daqui – Disse meu amigo (será que podia chamar de amigo).
- Coitado... – Disse uma moça que estava encostada no balcão do bar.
- Gente! – Meu amigo (será que podia chamar de amigo?) exclamou – Eu o conheço. Essa noite ele vai por um fim nisso! E ela voltará a ser como antes!
- Ele não pode ser... – Disse o cara atrás do balcão, que me olhava com olhos surpresos, mas alegres.
- É ele sim! – afirmou meu amigo (será que podia chamar de amigo?)
Todos se levantaram e começaram a aplaudir. Olhavam para mim, olhavam para o meu amigo (será que podia chamar de amigo?). Mas eu realmente não entendia nada. Antes queriam me matar. E agora estavam me aplaudindo. Da noite para o dia, ou melhor, de uma noite para outra. Enfim, eu não sabia quais os motivos para um nem para o outro.
Meu amigo (será que podia chamar de amigo?) olhou para mim e fez um sinal com a cabeça para acompanhá-lo. Não sei bem os motivos, mas eu o acompanhei. Orgulhoso por ser eu mesmo, apenas isso. Pois eu sabia que era especial para aquelas pessoas. E todos sorriam para mim, e faziam sinais de incentivo. Assim, desapareci pelo fundo do bar, atrás do meu amigo (será que podia chamar de amigo?), notando que agora as luzes estavam ficando mais fracas.