terça-feira, julho 18, 2006

motivos da minha solidão

Já era o oitavo bilhete que recebia em menos de uma semana de cursinho. As aulas tinham apenas começado e eu não estava nem um pouco interessado nas coisas que aqueles babacas falavam lá na frente. Apenas gostava de ficar deitado na minha carteira, pensando na vida e até mesmo cochilando de vez em quando.

Mas sempre que eu resolvia dar uma volta eu notava um bilhete todo amoroso na minha carteira ou mochila. A letra era realmente de menina, ou pelo menos parecia... E os recados diziam coisas do tipo: “desde que te vi não consigo mais parar de pensar em você”, “hoje eu passei toda a aula de matemática olhando você dormir”, “eu adoro o jeito que você se veste”, “não adianta rasgar meus bilhetes, eu ainda vou te conquistar”. Doce engano.
Nesse oitavo bilhete eu nem dei ao luxo da minha admiradora me ver lendo o próprio. Reconheci o bilhete pelo modo que estava dobrado, pelo tipo de papel e pela cor forte da caneta. Apenas amassei, sem dó nem piedade, e joguei no chão ao meu lado. Todo mundo tinha visto essa atitude. Provavelmente também ela. E pude dormir na aula de química numa boa!

O problema foi quando o sinal tocou e todos começaram a se retirar da aula para ir embora. Levantei também, suspirando fundo e me preparando para empurrar aquelas pessoas estúpidas e sem educação. O mundo é um lugar sinistro, a gente sempre tem que lutar muito para sobreviver e não há espaço para todos! Naquele momento essa declaração soava mais literal ainda. Então eu senti um dedo tocar suave no meu ombro, e eu me virei. Era uma garota, bonita. Acredito que ela era a menina mais bonita que eu já tinha visto na minha vida. Sua voz meio trêmula disse algo do tipo: “sou eu que mandei aqueles bilhetes e você nem leu o últ...” e eu respondi: “nunca encoste em mim de novo”. E então eu voltei a olhar para frente, buscando algum espaço livre no pequeno corredor que caminhava lentamente. Queria sair de lá o mais rápido possível. Então eu senti novamente o toque dos dedos no meu ombro, com a voz ao mesmo tempo soando quase no meu ouvido: “sabe, eu sei que você se acha o difícil, mas eu realmente gostaria de te conhe...”. Não dei tempo dela terminar. Apenas avancei o corpo um pouco para frente e girei meu tronco, fazendo questão quem eu cotovelo ficasse na altura daquele rostinho lindo. E foi mais lindo ainda quando meu cotovelo encontrou o nariz perfeito daquela criatura. Ela caiu para o lado, sobre uma das cadeiras, e todo mundo se afastou para entender o que estava acontecendo e olhando para a menina que estava caída. Com a mão no rosto ela começou a chorar, e suas lágrimas se misturavam com o sangue que saía de suas narinas. Tinha sido em cheio! Então eu apenas falei: “eu pedi para não encostar em mim, caralho!”

0 Comentários:

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial