sábado, maio 21, 2005

piração pseudo-especulativa sobre o sentimentalismo contemporâneo

Depois que o ser humano passou a dar grande importância para o seu lado sentimental, o mundo nunca mais foi o mesmo. Precisamente esse mundo no qual vivemos agora. Mas é estranho até mesmo esse jargão popular como “o mundo nunca mais foi o mesmo”. O que isso precisamente quer dizer? No fundo, se uma análise mais profunda permitir, o mundo realmente nunca foi o mesmo em nenhuma época. Obviamente me refiro a essas mudanças diante de como a sociedade era antigamente e de como ela é agora.
A razão sempre exerceu no ser humano a mais importante influência. Porém, nos dias de hoje, não é bem assim que funciona. Sempre pesamos nossos sentimentos quando vamos tomar alguma decisão. A volição não se baseia mais em argumentos puramente lógicos, e nossos gostos e desejos têm tanto peso quanto uma boa argumentação diante de muitas situações de nossas vidas. E esse peso foi inventado, foi colocado dentro de nossa cabeça, muito graças a novos moldes sociais, que são aqueles que estamos mais acostumados.
Apesar das origens dessa invenção ser de extrema importância, não irei me atrever a me aprofundar nesse assunto. Aqui basta afirmar que esse lado mais “humano” surgiu junto com uma nova sociedade, associada a queda de valores aristocráticos e a ascensão burguesa. Junto, imbricado, talvez para justificar essa mudança, também se criou a noção de “humanidade”. Os seres humanos deixaram as diferenças de lado, e a idéia mais aceita agora é que todos nós, por mais diferentes que somos, fazemos parte de um todo único chamado humanidade. Não possuo nada contra essa idéia, mas a total falta de consideração para as diferenças positivas pode prejudicar, como de fato prejudica, nossas relações sociais e emocionais. No Eu, aquilo que todos nós temos como o particular universalizado em nós mesmos, esse conflito também pode ser notado de certa maneira. Não como um reflexo imediato do que está apenas no universal, mas certamente com suas influências. Como uma parte não independente do todo. Se é que existe alguma parte de um todo que seja completamente independente dele...
O que notamos certamente é a origem de nossa angústia mais precisa. Temos sempre necessidade de sermos vítimas, nunca somos aquilo que realmente somos, mas um produto de nosso passado que é conseqüências de nossas ações. Mas nossas ações são ações nossas, mas que agora não são mais, pois as influências externas, das paixões e dos desejos, nos transformam apenas em fantoches conscientes. É exatamente essa falta de controle que nos deixa apáticos diante da radicalização de nossos sentimentos, e isso é aceito hoje em dia. Não existem problemas diante do domínio da paixão, que é até mesmo visto com uma espécie de ímpeto heróico. Isso poderia valer em tempos mais remotos, mas creio que hoje em dia existe a necessidade de um amadurecimento. Inclusive diante daquilo que vemos quando exatamente esse lado sentimental surgiu, para aprendermos que algumas coisas em nós mesmos podem mudar.
Esse ambiente volátil no qual vivemos está sempre em transformação intensa. Os relacionamentos humanos estão cada vez mais superficiais, pois a própria estabilidade social está questionada, colocada em segundo plano diante de valores (materiais) mais importantes. Diante desse quadro, o ambiente romântico não funciona mais. A instabilidade não permite mais sacrifícios em prol de “sentimentalismos de novela”, mas sim apenas diante de responsabilidades inseridas dentro de novos moldes sociais. A saber, a influência monetária e o status quo adquirido através do consumo constante de bens materiais. É somente para isso que o ser humano está moldado, não para viver seus amores burgueses e ultrapassados, que foram legítimos antigamente. Aqui o humano é sempre igual, mas em constante transformação para adaptação.
No Eu o processo é parecido. As influências da cultura romântica, desde a infância, influenciam sonhos que posteriormente serão quebrados diante da “dura” realidade. O Eu entra em constante conflito, com aquilo que o seu meio social exige dele e aquilo que ele busca idealmente, a saber, uma estabilidade repleta de alegria simples e singela. Felicidade esta, diga-se de passagem, também vendida como um produto a ser consumido.
Diante desse conflito acredito que seja de extrema importância estabelecer novos moldes para o posicionamento sentimental dos seres humanos. Não existe mais lugar para choros e fidelidade. Não existe mais espaço para um compromisso fixo e duradouro. Os novos padrões de vida, em muitos casos, não permitem que nos relacionemos devidamente com aqueles que queremos nos relacionar. O grande conflito ainda existe no nosso desejo mais íntimo de queremos, a qualquer custo, ainda manter viva os velhos costumes de casamento para a vida toda e o apego afetivo por longos períodos. Isso realmente pode acontecer, mas somente nos casos onde os envolvidos estão em completo acordo diante da efemeridade de suas situações e permitirem a existência de relacionamentos extraconjugais. Somente quando deixarmos velhos costumes, cuja essência está relacionada com a virtude, é que nascerá um novo ser humano. Mais solitário e deslocado. Um verdadeiro anti-social.
Mas o ser humano não é um ser anti-social, muito pelo contrário. O mesmo, apesar dos pesares, não permitirá que seu sentimentalismo morra sem, ao menos, tentar alterar alguma coisa a sua volta.

Observação: Os próprios termos relacionados já revelam a contradição especulativa gerada pela carência social do ser humano, que, conforme apresentado, contraria muito a sua essência efetiva.

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