sexta-feira, maio 20, 2005

mas... e freud?

Eu não sou louco. Sabe gente, a vida às vezes é estranha. E é justamente isso que deixam as coisas interessantes. Nunca saber exatamente o que acontecerá, até mesmo num futuro muito próximo. Ao dar qualquer passo podemos sempre cair. Mas o incrível é que não pensamos nisso a cada passo bem sucedido que damos, mas só quando realmente caímos. Não, eu não caí. Mas foi apenas mais um desses tropeços que sempre acontecem. Pelo menos comigo...
Eu vinha pela rua, caminhando do ponto de ônibus até a minha casa. Estava escuro. A luz naquele lugar nunca foi suficiente. Seriam dois postes por rua? Acho que era mais ou menos isso... Somando ainda que sempre um deles fica apagado, mais as árvores que fazem da penumbra sombra, pode-se concluir perfeitamente que estava escuro mesmo. Quando passo nessa rua eu sempre ando com cuidado, pois a calçada pode ser traiçoeira. Mas isso não importa, ou não interessa. O que eu quero que vocês saibam é que estava escuro.
A noite não estava fria. Por isso eu podia andar tranquilamente, sem me encolher todo ou tentando andar mais rápido para fugir logo do frio. Também não estava tão quente, o que permitia eu admirar a beleza da escuridão. Então comecei com meus devaneios. Vocês me conhecem, vocês sabem como eu sou. Apenas alguns minutos sozinho, fazendo alguma coisa mais “mecânica” (como andar), e eu levo meus pensamentos até o limite. Se é que isso existe. Mas isso também não importa. Comecei a cogitar a respeito de televisão, de música, de trabalhos para fazer e que deveriam ser feitos. E fui me aprofundando mais e mais nas teorias que só minha cabeça pode compreender. Subitamente eu vejo uma luz estranha que vinha de trás de mim. No começo acreditei ser um carro que virava a esquina e vinha pela rua, mas quando eu me virei para ter certeza eu vi a coisa mais estranha que tinha visto na minha vida! Mas só até chegar em casa e olhar novamente no espelho.
Lá estava aquilo. Uma bola estranha, de mais ou menos um metro de diâmetro, que flutuava suavemente na altura do meu peito. Ela estava a alguns passos atrás de mim, agora na frente, pois eu me virei e fiquei observando. Milhões de teorias físicas, biológicas e humanísticas pipocaram na minha cabeça na vã tentativa de explicar esse estranho fenômeno. Logo percebi que estava entrando em contato com uma raça alienígena de bolotas brilhantes e flutuantes que gostariam de me tomar como vítima para me analisar e, finalizada suas pesquisas, usarem das informações obtidas para destruir toda a raça humana. Mas a bola brilhante, um brilho meio ouro, meio prata, continuava em seu lugar sem apresentar aparente perigo.
Vocês sabem como eu sou curioso. Imediatamente eu me aproximei, e devagar eu coloquei a minha mão sobre essa bolota. Era quente, e seu toque lembrava o vidro. Mas continuava brilhando e flutuando. Tentei mover, e a bolota obedecia a todos os meus movimentos. Pude fazê-la abaixar sua altura, subir, ir para trás e para frente. Estava em minhas mãos. Eu disse então: “É minha!”.
“É minha, é minha, é minha”... Essas palavras ecoaram na minha cabeça, no estilo “fade out”, como nos desenhos animados. E quando esse processo terminou, eu notei que realmente era minha. Tinha caído de mim quando eu estava caminhando e pensando. O limite tinha sido atingido. Aquilo que eu contemplava na minha frente nada mais era do que a própria manifestação física dos meus sentimentos.
Tive a noção completa disso quando eu lembrei que fui incapaz de sentir medo quando a vi pela primeira vez. Também de me sentir feliz por ter brincado com ela. Também não conseguia rir ou chorar. Não conseguia sentir nenhum grau de afeto com qualquer coisa a minha volta. Apenas aquela bolota ali, flutuando, na minha frente. Olhei para os lados e não vi ninguém. A rua estava deserta, e pelo horário eu sabia que demoraria para alguém passar por ali. Então comecei a fazer os testes necessários para ter completa certeza. Pensei a respeito de meus familiares, e diante da imagem de perdê-los fui incapaz de sentir qualquer coisa. Pensei a respeito da minha namorada, mas fui incapaz de desejá-la. Pensei sobre meus bens materiais, meus desejos, meus sonhos. Tudo ainda estava lá, mas agora não tinham nenhum efeito emocional para mim. Engraçado isso? Racionalmente eu achava engraçado, se é que isso é possível, mas eu fui incapaz de sorrir. Uma sensação realmente muito estranha...
Eu pensava que devia sentir raiva, pois era inadmissível eu ficar sem sentimentos. Mas eu não conseguia sentir isso também. Eu queria sentir medo, por nunca mais experimentar dos prazeres sentimentais, como aquela alegria singela que temos quando estamos com alguém que gostamos, mas fui incapaz de sentir isso também. Era como se eu estivesse na total indiferença. Eu não tinha mais nenhum conflito, o que reinava absoluto era apenas meu lado racional que notava tudo isso.
Então apelei para esse lado, o único que tinha sobrado. Eu sabia que ficar sem sentimento seria horrível para a minha vida (mesmo que eu não pudesse sentir mais nada, sempre haveria aquela agulha racional me dizendo coisas a esse respeito, como eu sabia que era bom aquilo e como eu tinha perdido). Por isso eu tinha que solucionar, pegar novamente aquela bolota maldita! Como vocês podem notar hoje eu estou bem, com meus sentimentos novamente. E agora vocês estão curiosos para saber como eu fiz isso, certo?
Foi mais ou menos assim: Peguei aquela bolota, que obedecia a todos os meus comandos suavemente, e a elevei até a altura do meu peito. Encostei meu queixo na parte de cima, e com meus braços eu a abracei. Fui pressionando cada vez mais forte, como se quisesse quebrá-la. De repente ela sumiu, e eu caí no chão que voltou a ficar escuro. Ralei meus joelhos, e diante da dor que sentia eu amaldiçoei aquela bolota imbecil. Quando fiz isso, quando finalmente pude sentir prazer em xingar, eu fiquei feliz. E fiquei feliz por ter ficado feliz, de ter obtido novamente essa capacidade. E voltei para casa pensando nisso tudo, mas sempre olhando para trás para ver se não caía mais nada.
Na minha cama fiquei pensando que perder os sentimentos seria muito ruim. Eu não queria isso... Por outro lado eu não ligaria de perder algumas outras coisas, coisas que eu até gostaria de jogar fora. Seria legal esquecer a virtude no banco da praça, ou se questionar “mas onde eu deixei minha moral?”. E esse é um dos motivos pelos quais coloquei a foto da minha sanidade por toda a cidade, com o título de “procura-se”.

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