segunda-feira, março 28, 2005

Capítulo 02

Ele olhava para o mar azul sem esboçar nenhum sentimento, nenhuma expressão facial. Estava completamente concentrado, mas eu não sabia no quê. Depois de horas fugindo, trocando de veículos e pegando os caminhos mais tortuosos que eu podia imaginar, chegamos ao litoral como caças. Foi então que eu percebi que não havia motivos para me matarem. E eu perguntei para aquele rapaz:
- Por quê?
- Boa pergunta.
- Sério, me diga qual é o motivo!
- Sempre é necessário existir um motivo?
- Não sei se sempre, mas várias pessoas estavam tentando me matar. Eu devo ter feito alguma coisa que desagradou, sei lá...
- Continue...
- Ninguém quer matar alguém apenas por matar. Ainda mais um conjunto de pessoas... Eu devo ser um inimigo público, alguma ação minha no meu passado recente deve ter desa...
- “Ação minha no meu passado recente”? Você fala como um escritor medíocre de novelas de televisão. Você sabe muito bem o que você fez!
- Mas eu apenas estou vivendo a minha vida. Sossegado!
- Isso não é suficiente?
- Para me matarem? Seria?
- Existe um erro aqui...
- Erro? Que erro?
- Quem disse que eles queriam te matar?
- Eles estavam correndo atrás de mim, não estavam? Com pedaços de pedra, madeira... E gritavam meu nome!
- E qual o seu nome?
- Eu... Eu... Não sei!
- Óbvio! Você deixou de ser você faz muito tempo...
- Como assim?
- Existe uma diferença entre correr da morte e enfrentá-la realmente.
- Enfrentar dezenas de pessoas? Sozinho? Você está é louco...
- Não... Isso faz muito sentido. A vida que você vivia agora é uma página virada. Você sabe disso, mas tem medo de assumir. Como tem medo de aceitar a própria morte. Por isso você sabe quem você é, mas não lembra quem realmente é. Pois no fundo você agora é isso...
- Você está dizendo que estou morto?
- Todos estamos... Mas não é isso. Muito pelo contrário, é agora que você nasceu.
Eu não entendia mais nada. Ele permanecia sentado olhando para o mar azul. Buscou alguma coisa em seu bolso e retirou um cigarro. Com um isqueiro ele o acendeu e permaneceu alguns instantes contemplando algo que apenas sua mente compreendia. Não sei até que ponto minhas perguntas poderiam esclarecer minhas dúvidas ou me confundirem ainda mais. Então ele disse:
- Voltaremos para a cidade. Vejo agora que você ainda não está pronto. É necessário descobrir algumas coisas.
- Mas eu não quero voltar lá... Vão me matar!
- É necessário...
- Não vou!
- Você precisa descobrir sozinho. Adianta ficar sentado aqui?
Eu não sabia.

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