sábado, dezembro 25, 2004

Capítulo 09

Assim que a moça entrou naquela sala, dei dois passos para trás. O susto havia sido grande, pois desde o momento que ouvi o barulho da chave sendo passado pela porta até o momento que percebi quem realmente era eu havia pensado em milhares de possibilidades. Nunca ela, nunca essa moça com cabelo mal pintado de loiro, olhos claros, algumas sardas no rosto e corpo sensual. Ela me olhava séria. Eu até poderia dizer que ela sorria levemente, como se a vitória já fosse dela, como se tudo o que ela havia planejado tivesse dado certo. Eu não sabia dizer. Também não sabia o que fazer. Apenas respirava.
- Então, é aqui mesmo que eu pretendia te encontrar – ela disse.
Eu permaneci quieto. Ela sabia que eu ia acabar ali quando ela me disse tudo aquilo na rodoviária. Fui enganado e manipulado. Mas eu ainda tinha muitas dúvidas.
- O que está acontecendo? – eu perguntei.
- Nada do que for dito pode esclarecer as nossas maiores dúvidas.
- Não faz sentido. Eu não vim até aqui para passar por tudo isso.
- Mas você então sabe por que veio?
- Também não, mas isso não importa.
- O que importa então?
- Deixou de responder perguntas para fazê-las?
- Eu não estou fazendo perguntas para saber as respostas.
- Por que está fazendo então?
- Agora quem está é você, não eu.
- Tudo bem. O que você pretende fazendo tais perguntas?
- Se você me deixasse perguntar talvez você descobrisse.
- Qual foi a sua última pergunta?
- Boa pergunta. É uma pergunta que tem como resposta uma outra pergunta. E, caso eu perguntasse algo cuja resposta fosse outra pergunta e você fizesse o mesmo novamente, e assim por diante, então entraríamos no círculo vicioso da dúvida racional.
- Do que você está falando?
- Quem faz as perguntas agora sou eu. Mas a resposta para a sua pergunta é: O que importa?
- Não sei. Só sei que nem sempre o importante é aquilo que sabemos de imediato.
- Isso faz sentido apenas de um lado. Apenas do seu lado.
- Por quê?
- Enfim, olhe para a cadeira cor-de-rosa – E ela me apontou a cadeira.
- O que tem? – Eu me virei olhando novamente para a cadeira.
- Sabe por que ela está aqui?
- Sei sim. Eu sentei nela.
- Então você teve a visão...
- Tudo ficou mais claro.
- Deixe-me terminar minhas frases!
- Desculpe.
- Você teve uma visão incompleta da realidade que te cerca.
- Desculpe?
- Eu sei que é difícil de entender, mas não basta que as coisas façam sentido.
- Por quê?
- Muitas coisas não fazem sentido, mas mesmo assim você as aceita.
- Como o quê, por exemplo?
- Outra pergunta que respondo com mais uma pergunta: Como você veio parar aqui?
Então era esse o jogo dela. Responder parcialmente todas as minhas perguntas, e perguntar coisas que, sem dúvida, gerariam mais dúvidas. E assim eu ficaria louco, pois era isso que ela queria me mostrar. Tudo o que eu falasse, perguntasse, opinasse... Nada seria suficiente, tudo seria questionado e seria colocado em dúvida por essa moça. Confesso que sorri. Sorri e comecei a balançar a cabeça, enquanto ela me olhava ainda séria. Percebi que estávamos conversando sobre uma coisa, mas ao mesmo tempo querendo dizer outras coisas.
- Venha comigo. Está na hora de sair daqui – Ela disse. Então ela se virou de costas e fez um sinal com a cabeça para que eu a acompanhasse. Olhei em volta. A estante, a mesa... A cadeira cor-de-rosa. Tudo fazia sentido. Mas e agora? Não sabia para onde estava indo, como sempre. Eu já estava começando a me acostumar com isso.Dei de ombros e a segui, sem medo, e penetrei novamente naquele corredor escuro do qual havia vindo.

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